Fonte: Wikipedia
Laudo Natel, as asas do sonho tricolor
Dirigente de futebol revolucionário, visionário, torcedor uniformizado, governador paulista e, essencialmente, um apaixonado pelo São Paulo Futebol Clube.
A história do São Paulo Futebol Clube se entrelaça à vida de Laudo Natel de forma tão forte que é possível confundir as trajetórias da instituição e a do homem. Foi pelo trabalho de vanguarda do cartola que o clube inaugurou uma era de profissionalismo no futebol brasileiro e se tornou referência em organização fora das quatro linhas.
Em 18 de maio deste ano, a morte de Laudo Natel, aos 99 anos, encerrou uma das mais relevantes páginas da história são-paulina. Por mais de 70 anos, o dirigente manteve pelo clube uma relação de amor e devoção inabaláveis, que o fizeram patrono do time.
Nascido em São Manuel, interior de São Paulo, em 14 de setembro de 1920, Natel iniciou sua vida profissional como bancário no Banco Noroeste. Trilhou carreira de destaque no setor, foi promovido de cargo e transferido entre agências algumas vezes no interior paulista. Depois, ingressou no Banco Brasileiro de Descontos, que viria a se tornar o Bradesco, por lá se tornou diretor antes dos 30 anos de idade e assim chegou a São Paulo, em 1946.
Da arquibancada à cartolagem
Logo no ano de sua chegada à capital, aconteceu o encontro com o São Paulo que duraria pelo resto de sua vida e mudaria os rumos da história tricolor. A aproximação foi promovida por Luís Campos Aranha, que o apresentou a Cícero Pompeu de Toledo, então presidente do clube.
Antes, porém, o entusiasmo de Laudo Natel com o São Paulo foi combustível para sua contribuição ao fortalecimento da Torcida Uniformizada do São Paulo (TUSP), a primeira organizada do Brasil. Fundada em 1939 por Manoel Raymundo Paes de Almeida, a TUSP ainda engatinhava quando Natel passou a fazer parte dos uniformizados que acompanhavam o São Paulo nos estádios paulistas.
Os conhecimentos adquiridos no meio financeiro foram a ponte entre a arquibancada e a direção do clube. No início do anos 1950, Laudo Natel foi eleito diretor de finanças do São Paulo e adotou uma prática inovadora e que só se tornaria obrigatória anos mais tarde: passou a publicar os balanços financeiros anuais do clube. O São Paulo foi o primeiro clube brasileiro a tornar públicas suas contas e isso gerou uma imagem de credibilidade diante do mercado.
A repercussão externa foi boa, mas a interna foi melhor ainda e Laudo Natel ganhou notoriedade entre os sócios e conselheiros do clube. Assim, quando o presidente Cícero Pompeu de Toledo decidiu que era chegada a hora de o São Paulo Futebol Clube ter seu estádio próprio, Natel foi escolhido presidente da Comissão Pró-Estádio.
O criador plano Morumbi
Todos esperavam que ele desenhasse algum plano financeiro com empréstimos bancários, mas o que Natel propôs foi a medida mais impopular possível: vender o Canindé.
O atual estádio da Portuguesa era o único patrimônio físico do São Paulo. Foi adquirido na época da Segunda Guerra Mundial, com a compra facilitada pelo decreto de Getúlio Vargas que confiscava os bens de agremiações que faziam referência aos países do Eixo.
Construir um grande estádio a partir da estaca zero já era uma loucura, mas vender o único bem do clube era algo que beirava a irresponsabilidade. Com muita resistência e desconfiança o negócio foi feito. Um sócio são-paulino, Wadih Sadi, adquiriu o imóvel e o São Paulo conseguiu o dinheiro necessário para construir seu estádio.
O dinheiro era suficiente para uma grande obra, por isso, mais uma vez, Laudo Natel arriscou e promoveu o lema da Comissão Pró-Estádio:
“Se é um sonho, que seja grande!”
Foi assim que o São Paulo se lançou na construção do “maior estádio particular do mundo”. Com a determinação e capacidade de Laudo Natel à frente das negociações, o São Paulo conseguiu algo impensável nos dias de hoje: convenceu uma imobiliária a doar o terreno para a construção.
A Imobiliária Aricanduva pretendia lotear a área de 99.873 m² na região do Morumbi, então uma área rural, pantanosa e afastada do centro urbano. João Jorge Saad era o presidente da imobiliária e também corintiano. Fato é que Laudo Natel o convenceu — Deus sabe como — a doar 2/3 do terreno e o São Paulo compraria a parte final.
Negócio fechado e em 15 de agosto de 1952, o São Paulo lançou a pedra fundamental do terreno. Mesmo sem projeto arquitetônico, Laudo Natel quis chamar a atenção dos investidores para viabilizar o estádio.
Todas as alternativas modernas para levantar capital foram usadas mostrando o vanguardismo do dirigente. A principal foi a venda antecipada de três mil cadeiras cativas no estádio. O goleiro José Poy, ídolo do clube, ficou conhecido por bater de porta em porta para vender as tais cadeiras cativas.
Laudo NatelEnfim, a materialização do sonho
Foram 18 anos de obras — oito até o primeiro jogo no local —, mas o São Paulo conseguiu construir o maior estádio paulista. Durante a construção, foram 12 anos sem títulos, as dificuldades financeiras se acumulavam e a prefeitura do Estado chegou a oferecer o Pacaembu em troca do Morumbi inacabado. Laudo Natel recusou e declarou à época:
“O sonho do são-paulino não cabe no Pacaembu”.
Em 25 de janeiro de 1970, enfim, o Estádio Cícero Pompeu de Toledo, o Morumbi, foi inaugurado e entregue aos torcedores e ao clube como o maior patrimônio do São Paulo Futebol Clube. Na verdade, não é exagero algum afirmar que o Morumbi elevou o São Paulo a outro patamar no cenário brasileiro e, anos mais tarde, também no futebol mundial.
Esse redimensionamento também se deu pelo modelo de gestão implantado por Laudo Natel durante a presidência de Cícero Pompeu de Toledo. Apesar de bancário — ou justamente por isso — Natel nunca foi entusiasta dos empréstimos. A construção do Morumbi foi tocada majoritariamente com recursos adquiridos dentro do clube com sócios, torcedores e patrocinadores.
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